segunda-feira, 7 de junho de 2010

12- Blusa com zíper

 
Desabafei com ele o que pude pelo curto caminho. Antes de entrar na sala, Jack deu um beijo na minha testa, “Você se sentiria melhor se falasse isso pra elas... Não tem por que ficar se preocupando tanto assim.”.
Olha quem fala...
Eu andava tão irritada com tanta coisa, mas nenhum dos meus motivos fazia sentido. O que tinha de tão ruim em meu primo namorar minha amiga? Eles estavam felizes. O que tinha de tão ruim em minha amiga ter os problemas dela e não querer me contar tudo? Eu também fazia isso. Tudo tinha que ser do meu jeito?
Nem notei quando as aulas acabaram.


Não sei o motivo, mas enquanto me perdia em pensamentos - tentando achar o que realmente tivesse me deixado daquele jeito - e olhava aleatoriamente as minhas roupas no guarda-roupa, vi aquela minha blusa com zíper que nunca mais tinha usado e o que ela me lembrou quase me fez chorar.
Por que eu ainda guardava uma blusa antiga e que eu jamais usaria novamente?


 
Eu tinha completado treze anos há uma semana exatamente e pelo telefone ele perguntou se eu não queria ir até a sua casa...
“Tem certeza? O que eu vou fazer aí?”, perguntei com uma ingenuidade irritante.
“Ah, deixa pra lá. Daqui a pouco eu tenho que sair mesmo, nem sei por que perguntei isso.”.
Pensei que ele querer a minha presença daquele jeito significasse que ele estivesse apaixonado por mim. Aquela ideia me deixou tão contente.
Por que eu queria tanto assim ser amada?


“Mas eu não tenho problema em ir. Não estou fazendo nada aqui mesmo. E vai ser legal conhecer a sua casa...”, insisti.
Ele ficou em silêncio e me deixou tensa.
“Ákyl?”.
“Oi... Estou aqui. Só não sei se é uma boa ideia. Não sei o que eu faria. Eu estou agitado hoje, sabe...”.
Aquela frase deveria ter me afastado. Era o aviso que eu precisava. Mas se eu não fosse, ficaria me punindo o dia todo. Idiota! Mas como poderia adivinhar que ir me faria lamentar muito mais?
“Ah, o que tem?”.
E com isso consegui a permissão para ir.


Coloquei a minha nova blusa preferida. O Jack tinha me dado de presente de aniversário. Ela ficava tão bem em mim...
Ao chegar à vizinhança comecei a me preocupar com algum vizinho que pudesse me ver. Ninguém pensaria algo bom. Uma adolescente sozinha na casa de um homem solteiro. E não qualquer homem, mas o diretor de sua escola.
Toquei a campainha e ele não demorou a atender. Com a sua serenidade costumeira. Como se não fosse perigoso ser visto comigo ali na porta de sua casa.


Ele me mostrou somente a sala de estar. E me contou alguma história triste sobre a sua família. O fato de ele nunca ter falado sobre isso comigo antes e por ser um assunto que ele mantivesse em silêncio com tanto cuidado fez com que eu me sentisse especial.
Beijou-me no sofá da sala e só então eu percebi que havia uma música tocando. Suas mãos passearam pelo meu corpo de uma forma que me incomodaram. Levou-me até o quarto e eu fui sem hesitar.


Ficar nua na frente de um homem pela primeira vez e ainda de um homem tão indecifrável como ele me deixou muito insegura. Mas apesar de seus toques continuarem me incomodando, seus beijos me distraíam. E eu queria muito sair dali, mas eu sabia que ficaria até o final. Ele não dizia uma palavra e eu teria chorado se não estivesse surpresa demais com o rumo que a visita tinha levado. Quando terminou, ele sequer ficou deitado do meu lado. Pediu que eu me vestisse e tão logo me dispensou com a desculpa de um compromisso.
Deu-me um beijo rápido nos lábios bem na porta de sua casa, acho que a vizinha que caminhava na rua viu. Durante todo o meu caminho de volta, fiquei me perguntando sobre o motivo dele ter me tratado daquela forma tão fria. Mas arrumei desculpas por ele com a mesma facilidade de sempre. Devia ser difícil por sua historia com a esposa e filha. Talvez ele tivesse pensado nelas. Talvez ele estivesse chorando também. Eu o perdoei automaticamente.


Mas, vendo aquela blusa que inconscientemente eu tinha deixado de usar, eu me sentia traída e usada. Se ele me amasse não teria problema em esperar até que eu completasse dezoito anos e pudesse sair com ele às claras. Se por dois anos não tinha tido problema.
Cheguei a pensar que talvez ele estivesse com ciúmes dos rapazes com quem eu saía, mas... Só parecia mais uma desculpa que eu arrumava para ele. Estava na hora de deixar esse hábito.
Qual tinha sido o motivo de tudo aquilo de verdade? E por mais que ele me dissesse alguma verdade cruel o suficiente para que eu acreditasse, não faria diferença. Eu tinha sido uma idiota de qualquer forma.

 
Não conseguia jogar aquela blusa fora. Porque me lembrava do meu amigo cheio de sorrisos dizendo que tinha me visto desenhando uma blusa como aquela. E não tinha como eu contar algo assim para o Jack. Ele devia perceber que eu não a usava, mas enquanto ela estivesse no meu guarda-roupa a minha culpa seria menor.
Tentei vestir a blusa, mas o meu nervosismo fez a costura abrir. Não segurei mais as minhas lágrimas...

domingo, 6 de junho de 2010

11- Quem é vivo sempre aparece...


Assisti a todas as aulas naquele dia e, por não estar familiarizada com nenhum dos meus colegas de classe, agi como uma aluna exemplar. Não tinha distração, então só me restava estudar mesmo.
Quando tocou o sinal para o primeiro intervalo comecei a me preocupar. E se o Raffael também me procurasse no intervalo? Eu não queria isso.
Pensei no único lugar em que eu poderia ficar sem ser incomodada, era uma sala bem pequena com caixotes aglomerados. Eu tinha a chave graças à proximidade que tinha com o diretor, mas não sem muita insistência. Lá era perfeito para ficar sozinha, mesmo que eu a tivesse usado apenas uma vez ou duas.


Fui com pressa para a sala, mas pelo corredor a minha visão foi capturada por um cabelo alaranjado único. Ela continuava incrivelmente linda. As bochechas rosadas e sardentas. O tom de verde água em seus olhos. Qualquer mulher mortal queria ser exatamente como ela ou pelo menos ter metade de sua beleza. Como ela conseguia ser tão linda em tantos pequenos detalhes? A única coisa que destoava um pouco a sua beleza era a sua voz, que escapava para um tom mais agudo do que a maioria, mas até mesmo como ela falava fazia isso ser apenas um detalhe ignorável visto por olhos invejosos como os meus.


Eu não suportava a sua presença, ela me ofuscava completamente. Era impossível competir com alguém assim. Ela parecia tão fútil e vulgar que eu até lamentava tanta beleza usada tão descuidadamente. Mesmo que ela não parecesse ser uma má pessoa, eu sabia que não poderia ser sua amiga. De uma maneira bastante egoísta, eu pensava no quanto odiaria me sentir inferior o tempo todo.
Depois de um semestre inteiro ela apareceu novamente na escola. Ao vê-la tão sorridente caminhando pelo corredor ao lado do Scott que eu consegui entender o humor insuportável que a Mariana despejava em nossa última conversa. Kate James estava de volta, como ela poderia competir com isso?


Scott parecia sempre tão apaixonado ao lado da Kate que doía até mesmo no meu coração. Com a minha distração sequer me preocupei com o motivo da irritação da minha amiga. O que será que tinha acontecido entre ela e o Scott agora com a chegada da Kate? Mariana era tão ciumenta e incompreensível. Se até eu mesma estaria enlouquecida com algo assim, imaginei como ela não estaria.
Eu era uma péssima amiga no final das contas. Reclamando de que elas tinham se afastado de mim, mas já estava facilmente me conformando e acostumando com a ausência delas.
E talvez eu que estivesse cega pelo ciúme. Querendo minhas amigas apenas para mim. Odiava que elas estivessem apaixonadas e ter que dividi-las. Infantil e egoísta, mas mesmo tendo essa consciência eu não conseguia deixar de sentir meu coração doer ao pensar em tudo aquilo.
Desisti da ideia de ir para a salinha.


Tinha passado um dia ou dois, eu já nem sabia mais, desde a última conversa que tive com minhas amigas. Meu coração apertava enquanto eu as procurava pelo colégio. Eu ansiava por vê-las novamente. Reconhecia o quanto meus pensamentos eram exagerados e dramáticos e por isso mesmo eu não falava deles. Pelo menos, o quanto possível.
Estavam todos no refeitório, exatamente como no semestre passado. E assim que os vi sorrindo o meu coração se acalmou. Até mesmo a Mariana estava diferente. Dócil como quando a conheci. Sentada com eles eu me perguntei sobre como tinha conseguido ficar qualquer dia que fosse longe das pessoas que eu tanto amava.


Eu queria muito saber sobre como a Mariana se sentia, mas ela parecia tão bem que temi estragar o seu humor com uma pergunta assim. Mais tarde eu perguntaria a Yasmin, nem que eu tivesse que sequestrá-la do Derick. Era tão irritante que eles não se desgrudassem.
“O que foi, eheim, Lily?”, Mariana me perguntou de repente.
“Ahm?”.
“Você está estranha. Com essa cara preocupada e pensativa. Aconteceu alguma coisa?”.


Todos na mesa me encararam, tentando conferir o que a Mariana tinha acabado de dizer. Sorri nervosa e coloquei a minha mão sobre a do Jack na mesa, ele sempre se preocupava mais do que devia.
“Eita, estou normal. Só estou quieta ouvindo vocês...”.
“Pois é. Não tem nada de normal nisso.”, Mariana disse resignada, depois caindo na gargalhada com o restante do pessoal, eu ri sem humor, mas Jack não acompanhou. Esse comportamento dele que fazia as pessoas pensarem mal. Ele tinha que levar tudo tão sério?


“Tão engraçados... Deus me livre de ficar triste perto de amigos tão sensíveis assim.”, fui sarcástica.
Quando estávamos retornando para as nossas salas, meu amigo começou com o inquérito de preocupação. Queria que meu pai pudesse se preocupar comigo assim.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

10- Oi, Silvinha

 
Quando o Ricardo resolveu tomar um banho eu deixei a sala e fui para o quarto. Liguei o computador e acessei o MSN. Só tinha uma menina online, não me lembrava dela, mas era um daqueles contatos que só fazia número. Bufei.
Fiquei me distraindo com qualquer bobeira na internet, quando vi que alguém tinha iniciado uma conversa comigo pelo MSN. Silvinha... Não precisei de esforço pra saber quem era. Era estranho chamá-lo assim, não combinava com a imagem que tinha dele. Parecia feminino de alguma forma, mas ele não devia se incomodar.


Silvinha - oi moça
matando aula tb e
coisa feia rsrsrsrs
Era a minha chance de não ser mais ignorada por ele. Eu conseguiria de qualquer forma, mas estava tão nervosa que não fazia ideia de como.
Lih – kkkkkkk
sumido!
nunca mais te vi, menino
Silvinha – po depos d um forra fikei com o koraçao partido
Ele escrevia muito errado e aquilo só me fazia pensar no quanto eu estava perdida me interessando por alguém assim.
A conversa foi rápida e seguiu o caminho que desejei.
Silvinha – nem acredito
nem vo consigui durmi direito pensando nisso
xega cedo nao eskeci ta
agora tenho q sai
bjao linda


Eu ainda estava me acostumando com essa nova sensação de ser desejada. Afinal, passei a maior parte da minha vida sendo rejeitada. Nos meus últimos dois notei as mudanças dos olhares e das respostas. Mas ainda não conseguia acreditar. Tentava encontrar no espelho o que podia ter de atraente em mim e mesmo que encontrasse alguma coisa, simplesmente não fazia sentido que eu pudesse ser a preferida de alguém. Por isso, as declarações amorosas sempre soavam falsas para mim. E eu não sabia lidar com a aceitação, por mais que a ansiasse. Eu sequer conseguia me entender e, quanto mais pensava, mais perguntas surgiam.
Joguei-me na cama já sentindo o coração disparado, tensa imaginando o encontro no dia seguinte. Seria antes das aulas começarem, na escola mesmo. Involuntariamente comecei a pensar em desculpas para não ir. Alguém devia me dar um tapa para que eu parasse com minhas bobeiras.

 
Apesar de todo o frio na barriga e mil desculpas já preparadas, lá eu estava, caminhando apenas com o Jack ao meu lado. Tinha levantado cedo demais, deixando meus primos para trás e arrastando o meu amigo comigo.
“Tê, eu sei que estou parecendo uma boba, mas... Eu estou muito nervosa. Não sei o que falar com ele, nem como agir. E se ele me achar idiota demais? Porque eu sei que vou ficar praticamente muda.”, eu estava tão imersa na minha neura que quase cheguei ao ponto de pedir ajuda ao Jack. Paquerar não era o forte do meu amigo, nem de longe. Não fazia ideia de como ele conseguia dar tão pouca importância para isso.

 
Encontrar o amor da minha vida era o que me fazia levantar da cama todos os dias. Mesmo que eu estivesse um pouco perdida com meus métodos, eu continuava o procurando. Não era possível que ele não existisse. De alguma forma, eu sabia que ele não era o Raffael, mas mesmo assim eu segui. E esses pensamentos eu não contava para ninguém, nem mesmo para o Jack.
“Apenas seja você mesma, Sally. Não tem como ele não se apaixonar.”, ele esboçou um sorriso, “Nos vemos depois. Tchau.”, e saiu na minha frente pelo portão da escola.

 
Era uma idiotice que eu quisesse que o Jack ficasse comigo enquanto eu me encontrava com o Raffael. Apesar de não ser a primeira vez que eu passava por algo assim, sempre parecia ser. Odiava essa sensação.
Não o vi entre os pouquíssimos alunos que já estavam espalhados pelo pátio. Sentei-me no banco e consegui relaxar. Soltei uma gargalhada despreocupada, quando pensei no quanto estava me sentindo como uma boba só por causa de um encontro não oficial.

 
Levei um susto ao olhar para o lado e ver quem pensei que não veria.
Ele tinha me visto rir que nem uma doida? Alguém me mate, por favor!
Ele parecia tão menos intimidador ou atraente daquele ângulo. Parecia como um dos meninos da banda. Perdi a vontade de beijá-lo instantaneamente e, apesar da culpa que já começava a sentir porque iria rejeitá-lo novamente, fiquei mais relaxada.

 
“Quase não consegui dormir.”. Foi engraçado ver aquele rapaz enorme e despojado me dizendo algo assim. A forma como ele disse, se balançando sem me encarar e com a voz baixa tentando não aparentar toda a vergonha que continha.
Meu coração deu um salto, mas eu sabia que era apenas o meu ego alimentado se manifestando. Eu seria muito egoísta se continuasse me encontrando com ele vendo o quanto o tinha empolgado com tão pouco. Eu só precisava voltar a chegar atrasada na escola que ele entenderia o recado.


Ele me fez companhia até que o sinal da primeira aula tocasse. Um dos rapazes mais populares da escola estava interessado em mim. Eu quase não conseguia segurar meu sorriso ao pensar nisso. Eu estava consciente de que ele não deveria ter muitas pretendentes por quase não ser bonito. E parecia gostar de namorar sério, o que eu também achava engraçado, porque ele era absurdamente irresponsável.
O que teria acontecido com o seu último namoro? Ele tinha até levado um buquê de flores para a namorada no dia do seu aniversário. Parecia tão apaixonado.