1- Droga de manhã!

“Como assim me separaram de todo mundo nessa merda de sala?”, gritei olhando pela terceira vez a lista que estava pregada na parede da sala seis.
Jack passou os olhos pela lista acompanhando com os dedos.

“Não é a merda do meu nome aí nessa lista?”, estava irritada demais para me preocupar com os olhares dos outros alunos.
“É... Estamos mesmo em turmas diferentes.”, Jack disse com um leve tom entristecido.

Ponderei o meu tom de voz, para que ninguém além do Jack ouvisse, “Acho que isso foi coisa do Bruno, Tê... Deve estar com raiva de mim mesmo.”.
Meu amigo me olhou pensativo por um segundo, “Você passou com custo ano passado, Ly. Acho que nos colocarem em salas diferentes vai ser algo bom.”, ignorou completamente o meu comentário sobre o Bruno.

“Ah, que bom que pensa assim. É mesmo sempre incentivador ficar desconfortável e solitária dentro de uma sala de aula. Claro que vou aprender muito esse ano.”, abusei do sarcasmo.
Jack suspirou pesaroso, “Ficar irritada não vai ajudar em nada, Sally. Acho que o melhor que podemos fazer é ver o lado bom da situação... Se fosse assim, eu nem estava estudando mesmo...”.

Não gostava quando ele falava com pouco caso sobre a própria vida.
“É, você está certo. E fora da sala nos vemos o tempo todo mesmo, né! Falando nisso... Você viu as meninas por aí? Os gêmeos já estão fazendo social, mas as meninas ainda não encontrei.”.
“Serve aquelas duas logo ali?”, Jack apontou para a sala ao lado e vi as duas procurando seus nomes na lista.

“Vou procurar a minha sala. Vai lá falar com elas.”, deu um beijo no topo da minha cabeça e sumiu, antes que eu pudesse dizer qualquer coisa.
“Olha só a nossa mascote ali perdida.”, ouvi a voz da Mariana.

Virei novamente na direção delas e sobressaltei-me ao vê-las a dois passos de distância.
“Perdida mesmo, tadinha.”, Yasmin disse rindo.
Abracei com força as duas ao menos tempo.
“Odeio vocês e seus namorados!”, disse fazendo beicinho tentando esconder a minha real tristeza com a minha afirmação.

“Plural uma vírgula. A única que tem namorado aqui é a Yasmin.”.
Fiz um barulho com a boca, demonstrando a minha falta de credibilidade nela.
“Nem falo nada, dona Mariana. Se você e o Scott não estão namorando, não sei o que fazem tantas horas juntos então.”.
Ela fez cara feia, previ uma discussão chata chegando.

“O bom é que estão aqui agora! Já sabem em que sala estão?”, mudei de assunto.
“Nessa aqui do lado mesmo. Pelo visto estamos separadas esse ano.”, Yasmin.
“Só em pensar que não vou mais ouvir a Sally conversando a aula toda já fico feliz.”, Mariana falou com tanta naturalidade que duvidei que fosse brincadeira... Preferi ignorar.

“Você já está sabendo, né, Ly, que não vamos mais ter os mesmos luxos do ano anterior...”, Yasmin começou.
“Ahm? Não estou sabendo de nada.”.
“Pra variar...”, Mariana. Sério, queria muito bater nela naquelas horas.

“Devido aos gastos excessivos do ano passado com notebook, televisão e afins. Agora voltamos à idade da pedra... Caderno e quadro branco.”, Yasmin.
“Ah, mentira! Impossível isso... Até parece que nossos pais não podem pagar por isso.”, revirei os olhos com aquele absurdo.

“É relativo. Apesar de poderem, reclamaram bastante e isso foi mais do que o suficiente para a direção fazer a vontade deles. Duvido que meu pai tenha reclamado sobre isso. Foi coisa dos metidos a ricos e mãos de vacas. Agora temos que pagar por todos. Até o dormitório está sendo revisto. Porque deu muita dor de cabeça... Virou bagunça isso aqui.”, Yasmin.
“Meu, sinceramente, por que...”, eu iria completar com ‘Senão tem dinheiro, por que vem pra cá?’, mas lembrei que a Mariana poderia ficar sentida.

“Por que o quê?”, Mariana ainda com cara amarrada.
Mentir era sempre uma droga. Precisava de um freio na minha boca.
“Ah, essa palhaçada toda me irrita demais. Nem quero mais falar sobre isso. Só sei que nem trouxe nenhum material pra aula. Vai ser ótimo isso!”, disfarcei com sarcasmo.

“Quer material? Eu tenho alguma coisa no armário.”, Yasmin ofereceu.
“Não, não... Pode deixar que me viro.”.
Mariana fez um som com a boca desaprovando, “Não quer mesmo estudar.”.
Bufei e ignorei.

“Vou procurar o Jack, depois a gente se vê.”, joguei beijos e saí da presença delas o mais rápido possível. A Mariana sabia mesmo como me tirar do sério.
 Sentei no mesmo banco do pátio que sempre via o Samuel sentado antes do início das aulas. Suspirei triste quando novamente pensei em como seria sem graça meus intervalos sem poder admirá-lo. No final das contas não cheguei mesmo a ter uma conversa com ele pessoalmente. Quando eu dizia que era tímida não acreditavam em mim, mas estava aí mais uma prova.

Não estava com a menor vontade de assistir alguma aula.
Maldito Bruno!
Inesperadamente o Bruno se sentou ao meu lado no banco. Olhei incrédula.
“Oi, senhorita! Quanto tempo... Você está bem? Como foram as suas férias?”, ele perguntou tão naturalmente que me senti uma idiota por ter pensado todas aquelas coisas ruins dele, desde que rompi o que nem havia começado.